Um corpo quer outro corpo.
Uma alma quer outra alma e seu corpo.
Este excesso de realidade me confunde.
Jonathan falando:
parece que estou num filme.
Se eu lhe dissesse você é estúpido
ele diria sou mesmo.
Se ele dissesse vamos comigo ao inferno passear
eu iria.
As casas baixas, as pessoas pobres,
e o sol da tarde,
imaginai o que era o sol da tarde
sobre a nossa fragilidade.
Vinha com Jonathan
pela rua mais torta da cidade.
O Caminho do Céu.
Adélia Prado
(1935)
(pescado do Poemblog)
sábado, maio 30, 2015
quinta-feira, maio 21, 2015
domingo, maio 17, 2015
Um texto de 2014
Escrevi esse texto no ano novo de 2014. Estava amando, estava viajando, estava feliz. 2015 não está tão bonito. Mas que pueril é ler a esperança que a felicidade proporciona.
"Um ciclo se fecha e outro se abre. Um que ano morre e outro
que nasce. Clichês repetidos a cada ano, a cada aniversário, a cada queima de
fogos, a cada Natal em família. Uma porta se fecha e outra se abre. Esqueça o
velho, comemore o novo, é o que dizem. E nem é assim que 2014 se despede de
mim. Um ano rápido, ligeirinho, piscante. Eu acordei, ele nasceu, eu pisquei
ele se foi. 2014 foi-se com copas,
futebóis, eleições, decepções, cidades caóticas e novas, horas perdidas em
engarrafamentos e buzinas raivosas (e alguns caminhos perdidos aqui e acolá
porque sou assim desorientadinha). Foi-se com trabalho, muito trabalho, com
mudanças, com locuções, com ligações, com gravadores, fones de ouvido e
microfones. Foi-se com amigos novos, amizades
renovadas, mulheres “na área”, segredinhos, risadas, músicas, nuvens,
passatempos, correrias. Foi-se com quilos e cuidados, trazendo saúde. Foi-se
com amor de irmão e de amigo que se modifica e fica por aí se exibindo e me
chamando de besta (porque nunca morre). E ainda é com sonhos que se realizam,
com pé na estrada, com muito “Prost”, com muita caminhada, sorrisos, com
descobertas, maravilhas, iguarias, paisagens e lembranças. Com parcerias, com
abraços, com beijinhos, com carinhos sem ter fim. Então, 2014, não se despeça
assim tão rápido. Abrace longamente 2015 e dê alguns conselhos. Que seja bom,
que seja leve, que assim seja".
terça-feira, maio 05, 2015
Inscrição para uma Lareira
A vida é um incêndio: nela
dançamos, salamandras mágicas.
Que importa restarem cinzas
se a chama foi bela e alta?
Em meio aos toros que desabam,
cantemos a canção das chamas!
Cantemos a canção da vida,
na própria luz consumida…
(Mario Quintana)
(Poema publicado originalmente no livro Esconderijos do Tempo, retirado de Poesia Completa – Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2005, p. 490)
Nesta data, em 1994, Quintana retornava pro lado de lá. Meu autor preferido. um dos meus poemas preferidos e que dão nome a esse blog. Salve, meu querido Quintana.
segunda-feira, maio 04, 2015
domingo, maio 03, 2015
Sobre homens truculentos ou sobre pessoas que se negam a sentir.
Eu tenho alguém que foi muito caro há alguns meses. Ainda é, acredite, mas não me faz mais falta. Assustava pensar que seria como outros que passaram na minha vida: daqui a pouco esqueceria seu rosto e as pequenas coisas que me faziam sorrir. Eu sempre me apaixono pelas pequenas coisas. (É que outro dia eu estava no banco pagando contas e vi um ex-namorado de há 3 mil anos atrás e pensei: será que é ele mesmo? Eu esqueci o rosto. Os detalhes. A voz. Fiquei tão reflexiva, pensando como a importância vira desimportante.).
Mas já cheguei à conclusão de que as pessoas passam na minha vida com um objetivo. Se somem depois, o que se há de fazer? Guardar o que aprendi e seguir. Eu tenho guardado as coisas certas, acho. O que não quer dizer que não passe um tempo guardando umas quinquilharias, tem muitas miudezas inúteis destruindo uma parte boa de mim. Mas nem é sobre isso que quero falar.
É que vi uma foto. A gente faz dessas, às vezes: vai ver se a pessoa tá bem. Se ela tá sorrindo. Se os problemas passaram. Não é saudável, quase nunca. (Inclusive, não recomendo). Mas foi daí que me veio uma reflexão que não se restringe a essa pessoa específica. Eu fiquei pensando em como as pessoas sensíveis podem se esconder atrás da truculência. Pelo medo de serem julgadas. Pelo local onde trabalham. Pela família. Pelas pessoas/amizades com quem convivem.
Os homens são tão vítimas disso que chego a sentir piedade. Tenho conversado sobre isso com tanta gente. E nem sou eu que puxo o assunto, eles só vêm. Há alguns dias, um amigo disse que teve que aprender desde criança que não podia ter sentimentos, como sentir medo, porque era homem. Meninas podem sentir medo e serem consoladas. Meninos, nem tanto. Ontem vi um filme com um personagem representando aquele pior tipo de homem: o que olha para os lados procurando mulheres, como se procura carne em rodízio. Argh. Um amigo que via o filme comigo disse: não sou assim, mas ninguém precisa ficar sabendo. Porque os homens são sempre julgados pelo grau de macheza. E isso esconde o grau de humanidade das pessoas. E isso é muito, muito triste.
Um dia me apaixonei por esse cara do começo do texto. Eu gostava quando ele falava de música. Quando ele revelava assim sem querer uns traços do coração. Quando ele sentia pena dos alunos. E quando queria muito fortemente que cada um deles crescesse na vida. Quando tinha muito carinho pelos animais. Eu achava bonito como ele cuidava dos pais. Ele chorava nas cenas tristes dos filmes. Ele gostava de ficar apenas abraçado comigo por longas horas. Ele era um cara legal. Mas na maior parte do tempo ele tentava ser um macho. Um truculento. Um cara que não ligava pra sentimentos. Um insensível. Aquele cara que não quer sentir nada. Aquele cara que parece estar sempre tentando provar pros outros que não está nem aí pra nada. Que não quer parecer fraco, entende? Isso é tão nocivo. Era pra mim. E pra ele mais ainda. Porque no fim das contas ele é uma pessoa bonita. E eu não me importaria em lidar com a fraqueza. Eu, que tenho tantas fraquezas. Somos humanos, enfim.
Quantas pessoas bonitas estão se escondendo atrás de máscaras horrendas? Quantas pessoas sensíveis estão com medo de se machucarem e serem julgadas? A vida machuca mesmo. Eu mesma estou cheia de cicatrizes. Não é fácil. Mas ando arriscando. Não tenho conselhos. Não tenho advertências, nem pedidos. Só prometo quando tiver um filho, um dia, quem sabe, ensiná-lo que sentir não é vergonha nenhuma. É sinal de humanidade.
Mas já cheguei à conclusão de que as pessoas passam na minha vida com um objetivo. Se somem depois, o que se há de fazer? Guardar o que aprendi e seguir. Eu tenho guardado as coisas certas, acho. O que não quer dizer que não passe um tempo guardando umas quinquilharias, tem muitas miudezas inúteis destruindo uma parte boa de mim. Mas nem é sobre isso que quero falar.
É que vi uma foto. A gente faz dessas, às vezes: vai ver se a pessoa tá bem. Se ela tá sorrindo. Se os problemas passaram. Não é saudável, quase nunca. (Inclusive, não recomendo). Mas foi daí que me veio uma reflexão que não se restringe a essa pessoa específica. Eu fiquei pensando em como as pessoas sensíveis podem se esconder atrás da truculência. Pelo medo de serem julgadas. Pelo local onde trabalham. Pela família. Pelas pessoas/amizades com quem convivem.
Os homens são tão vítimas disso que chego a sentir piedade. Tenho conversado sobre isso com tanta gente. E nem sou eu que puxo o assunto, eles só vêm. Há alguns dias, um amigo disse que teve que aprender desde criança que não podia ter sentimentos, como sentir medo, porque era homem. Meninas podem sentir medo e serem consoladas. Meninos, nem tanto. Ontem vi um filme com um personagem representando aquele pior tipo de homem: o que olha para os lados procurando mulheres, como se procura carne em rodízio. Argh. Um amigo que via o filme comigo disse: não sou assim, mas ninguém precisa ficar sabendo. Porque os homens são sempre julgados pelo grau de macheza. E isso esconde o grau de humanidade das pessoas. E isso é muito, muito triste.
Um dia me apaixonei por esse cara do começo do texto. Eu gostava quando ele falava de música. Quando ele revelava assim sem querer uns traços do coração. Quando ele sentia pena dos alunos. E quando queria muito fortemente que cada um deles crescesse na vida. Quando tinha muito carinho pelos animais. Eu achava bonito como ele cuidava dos pais. Ele chorava nas cenas tristes dos filmes. Ele gostava de ficar apenas abraçado comigo por longas horas. Ele era um cara legal. Mas na maior parte do tempo ele tentava ser um macho. Um truculento. Um cara que não ligava pra sentimentos. Um insensível. Aquele cara que não quer sentir nada. Aquele cara que parece estar sempre tentando provar pros outros que não está nem aí pra nada. Que não quer parecer fraco, entende? Isso é tão nocivo. Era pra mim. E pra ele mais ainda. Porque no fim das contas ele é uma pessoa bonita. E eu não me importaria em lidar com a fraqueza. Eu, que tenho tantas fraquezas. Somos humanos, enfim.
Quantas pessoas bonitas estão se escondendo atrás de máscaras horrendas? Quantas pessoas sensíveis estão com medo de se machucarem e serem julgadas? A vida machuca mesmo. Eu mesma estou cheia de cicatrizes. Não é fácil. Mas ando arriscando. Não tenho conselhos. Não tenho advertências, nem pedidos. Só prometo quando tiver um filho, um dia, quem sabe, ensiná-lo que sentir não é vergonha nenhuma. É sinal de humanidade.
sábado, maio 02, 2015
Poema de tantas faces que nem posso contar
Quando nasci, uma médica pequena disse:
Ela tem um defeito incurável.
Era apenas uma orelha amassada
Mas legitimou o corolário de defeitos
(que eu me recuso a curar)
e que me acompanham por toda uma vida.
As casas de Guaramiranga estão mais coloridas
O fôlego curto, mais comprido
As nuvens continuam de algodão
Mas o céu tem ficado menos azul
Já participo de rodas de conversa;
não sou tão inteligente que possa ter opinião sempre
nem tão burra que saiba o tempo todo sobre tudo
Mas pelo sim e pelo não, às vezes prefiro calar.
A mulher por trás dos óculos coloridos
Costuma sorrir e evitar olhares
Diz que fala sem problemas
Mas tem uma timidez incurável
Se o mundo fosse vasto, eu estaria caminhando
Mas o mundo é pequeno, ridículo e minúsculo
E eu sou pequena, ridícula e minúscula;
Eu mereço o mundo e ele ama me contrariar.
Eu não deveria terminar aqui.
Mas é melhor não desnudar uma alma que treme
Transpor os limites da sinceridade
É tão perigoso que não tem volta.
(escrevi esse poema muito imperfeito e muito amador após ler "Poema de sete faces", de Carlos Drummond de Andrade e "Com Licença Poética", de Adélia Prado).
Ela tem um defeito incurável.
Era apenas uma orelha amassada
Mas legitimou o corolário de defeitos
(que eu me recuso a curar)
e que me acompanham por toda uma vida.
As casas de Guaramiranga estão mais coloridas
O fôlego curto, mais comprido
As nuvens continuam de algodão
Mas o céu tem ficado menos azul
Já participo de rodas de conversa;
não sou tão inteligente que possa ter opinião sempre
nem tão burra que saiba o tempo todo sobre tudo
Mas pelo sim e pelo não, às vezes prefiro calar.
A mulher por trás dos óculos coloridos
Costuma sorrir e evitar olhares
Diz que fala sem problemas
Mas tem uma timidez incurável
Se o mundo fosse vasto, eu estaria caminhando
Mas o mundo é pequeno, ridículo e minúsculo
E eu sou pequena, ridícula e minúscula;
Eu mereço o mundo e ele ama me contrariar.
Eu não deveria terminar aqui.
Mas é melhor não desnudar uma alma que treme
Transpor os limites da sinceridade
É tão perigoso que não tem volta.
(escrevi esse poema muito imperfeito e muito amador após ler "Poema de sete faces", de Carlos Drummond de Andrade e "Com Licença Poética", de Adélia Prado).
Assim tão solta
Fiz esse texto há 5 anos. Será que pouca coisa mudou dentro de mim?
Não, não me deixe assim tão solta
Porque quando você solta da minha mão
me dá um quê de nervoso, um quê de abandono
Faça a gentileza de me querer, de me prender
Saiba ser meio meu, meio do mundo
Mas que eu sinta que posso competir com o mundo
É que às vezes eu preciso de um cais pra aportar
de um abraço pra me aconchegar
Preciso de uma poesia real para pôr no papel
Preciso ter certeza de que minha música tem dono
Preciso dar espaço no meu colo
Entre meus braços há um vazio triste
Meus dedos pedem alguém pra afagar
E os meus pés querem um par de companhia.
Não, não me deixe solta por aí, que eu posso me perder
E aí quem é que vai me achar?
Não, não me deixe assim tão solta
Porque quando você solta da minha mão
me dá um quê de nervoso, um quê de abandono
Faça a gentileza de me querer, de me prender
Saiba ser meio meu, meio do mundo
Mas que eu sinta que posso competir com o mundo
É que às vezes eu preciso de um cais pra aportar
de um abraço pra me aconchegar
Preciso de uma poesia real para pôr no papel
Preciso ter certeza de que minha música tem dono
Preciso dar espaço no meu colo
Entre meus braços há um vazio triste
Meus dedos pedem alguém pra afagar
E os meus pés querem um par de companhia.
Não, não me deixe solta por aí, que eu posso me perder
E aí quem é que vai me achar?
sexta-feira, maio 01, 2015
Amor Feinho (Adélia Prado)
Eu quero amor feinho.
Amor feinho não olha um pro outro.
Uma vez encontrado é igual fé,
não teologa mais.
Duro de forte o amor feinho é magro, doido por sexo
e filhos tem os quantos haja.
Tudo que não fala, faz.
Planta beijo de três cores ao redor da casa
e saudade roxa e branca,
da comum e da dobrada.
Amor feinho é bom porque não fica velho.
Cuida do essencial; o que brilha nos olhos é o que é:
eu sou homem você é mulher.
Amor feinho não tem ilusão,
o que ele tem é esperança:
eu quero um amor feinho.
Amor feinho não olha um pro outro.
Uma vez encontrado é igual fé,
não teologa mais.
Duro de forte o amor feinho é magro, doido por sexo
e filhos tem os quantos haja.
Tudo que não fala, faz.
Planta beijo de três cores ao redor da casa
e saudade roxa e branca,
da comum e da dobrada.
Amor feinho é bom porque não fica velho.
Cuida do essencial; o que brilha nos olhos é o que é:
eu sou homem você é mulher.
Amor feinho não tem ilusão,
o que ele tem é esperança:
eu quero um amor feinho.
(Do livro Bagagem. Rio de Janeiro: Record, 2011. p. 97)
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